Praia do Rei
Muito antes da Polis e do 25 de Abril, a minha primeira praia na Costa da Caparica foi a Praia do Rei. A Ponte Salazar (agora 25 de Abril, distorcendo os factos históricos), ainda não tinha sido inaugurada.
E porque se parte do
princípio que há sempre um motivo para o que acontece, a oportunidade foi neste caso, a razão - a Directora da Escola
onde eu trabalhava tinha familiares com quinta e casa para férias naquela zona e de vez
em quando, nos domingos, convidava algumas de nós (geralmente as de origens
mais distantes) para irem lá passar o dia.
Terminal do Cais do Sodré em 1947 e actualmente
Partia-se num Ferry boat que saía da Terminal Fluvial do Cais do Sodré para Cacilhas, juntamente com o Mini Morris de cor creme.
Ferry boat 1960 (Foto António Homem Cristo); "Eborense" de 1957 (em actividade?) e um dos actuais
Chegadas lá, íamos então de carro até à referida praia. Penso que ainda não devia haver parque de estacionamento porque me lembro de caminhar por entre vegetação e dunas até chegar às diminutas barracas.
Parecia uma grande
aventura e que Lisboa ia ficando muito longe.
Mas a odisseia - levantar
cedo, viagem um tanto turbulenta - rapidamente ficava compensada perante a
amplidão dum mar tão azul, imponente, convidativo, relaxante e a vastidão dum
areal branco, limpo, quase desabitado, só nosso!
A maioria das pessoas, que não eram muitas, ficava pelas Praias da
Vila porque havia poucos carros e a Locomotiva da Transpraia, num vaivém entre as dunas, era o único
acesso que os veraneantes tinham para chegar aos areais até à Fonte da Telha.
Transpraia (Foto de "Jornal da Região") e dunas
Já existia o Parque de Campismo " Clube de Campismo de Lisboa - Costa da Caparica", onde a minha amiga Maria Amélia passava a maior parte do tempo das férias.
No fim da manhã, estimulada pelo calor e pelos banhos, a fome já não se deixava iludir. Era altura de fazer uma boa pausa para ir assar as sardinhas, cozer as batatas, misturar uns legumes e beber uns refrescos ou uma salada russa, ou umas carnes frias com frutas várias. Havia sempre quem tivesse jeito para sobremesas doces a que se seguia um café de balão.
Arrumada a cozinha e
bem saciadas, já podíamos palmilhar de novo o mesmo caminho para uma tarde de
mais mar, sol e alguns curtos passeios na escaldante areia até por volta das 20
horas.
Banhadas de água e sol, o regresso a Lisboa acontecia lânguido e indolente.
Banhadas de água e sol, o regresso a Lisboa acontecia lânguido e indolente.
Ponte 25 de Abril captada de "AlmaDalmada"
Praia da Mata e limpando a areia
Lá encontrava sempre as mesmas famílias nas suas casas de madeira muito coloridas, com um poço de água doce à porta (!) para veraneio. E tinha amigos que também alugavam os rurais e populares bungalows por um custo bastante acessível para usufruírem não só da praia mas também da simpática e piscatória terra Caparica, de ruas pacatas, durante o maior tempo possível.
As crianças esperavam ansiosas pela senhora dos bolos que os transportava numa caixa branca de letras vermelhas sobre a cabeça, equilibrada por uma rodilha. E pelo vendedor de “Há fruta ou chocolate”, referindo-se aos deliciosos e fresquinhos rajás.
Vendedor de batatas fritas, gelados, bolachas e pipocas mas não de bolas de berlim, na Costa (foto de Jorge Alexandre)
Á tarde
podia presenciar-se a chegada dos pescadores que, ajudados pelos familiares (e
por muitos dos curiosos) puxavam as redes.
Como os dias eram compridos, um passeio de meia hora nas locomotivas abertas do transpraia até à Fonte da Telha (cerca de 9 Km de linha), era o máximo!
Inauguração do Transpraia em 1960
Pescadores da Caparica (Peças soltas)
Como os dias eram compridos, um passeio de meia hora nas locomotivas abertas do transpraia até à Fonte da Telha (cerca de 9 Km de linha), era o máximo!
Segundo o proprietário,
“é um dos poucos ícones da Costa que ainda existem”. Criado há 50 anos, diz-se
que está em risco de deixar de circular por falta de passageiros, devido à mudança do terminal para a Nova Praia.
Será que já terminou?
Será que já terminou?
Estação (foto Vespa Clube de Portugal)
E pouco depois do 25 de Abril, deixei definitivamente de ir para a Costa.
O caravanismo permanente de roulotes que
dificilmente sairão sem reboque, o crescimento acelerado na segunda metade do
século XX que transformou a Vila num caos urbanístico, a destruição de dunas e
vegetação, o amontoado de barracas que se ergueu na mata de Santo António
acabando mesmo por se estender para terrenos vizinhos e antigas matas nacionais
do Instituto de Conservação da Natureza - constituído na sua maioria por
pessoas vindas das ex-colónias portuguesas - e o banditismo, eram demasiados
motivos para não voltar.
Fotos captadas em Google