Antes de ter
passado à situação de reforma, Agosto era o meu habitual mês de férias. As
escolas estão fechadas e muitas empresas também. O clima permite ficar horas a
tomar sol numa praia de eleição e viajar para locais desconhecidos ou para outros
a que sempre queremos voltar, com bagagens mais leves.
Tem como reverso
da medalha a maior procura de serviços que torna tudo mais caro…
E o arquipélago dos
Açores é sempre uma opção fantástica, exótica, onde floresce a natureza em
estado puro e se desfrutam boas praias em pleno Atlântico!
Em Agosto de 1988, também Angra do Heroísmo, na Ilha Terceira, foi uma das cidades preferidas,
crista de colinas aberta em anfiteatro sobre duas baías separadas pelo extinto
vulcão do Monte Brasil, local escolhido pelos primeiros povoadores.
Mais
de uma vez com parte activa na história de Portugal, a UNESCO classificou-a como cidade Património Mundial desde
1983 devido à riqueza da sua herança edificada.
Santa Bárbara,em pedra de Ançã policromada, séc. XV e Fortaleza de S. João Baptista
Em reconhecimento de “tantos e tão destacados serviços”, o Decreto de 12 de Janeiro de 1837 já lhe tinha conferido o título de "mui nobre, leal e sempre constante cidade de Angra do Heroísmo" e condecorou-a com a Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada.
Apresenta uma paisagem
costeira que permite
observar um sistema complexo e dinâmico, onde os factores vulcânicos e
culturais interagem e evoluem em conjunto e que desce suavemente desde a serra de Santa Bárbara, formando
pequenas baías e enseadas.
O
imenso património natural de baías, furnas, grutas, ilhéus, lagoas, matas,
montes, parques, prainhas, serras, zonas balneares assim como museus e
instituições culturais são tantos que, não sendo possível descrevê-los,
aconselho vivamente a visitar.
Um pouco cansados
(eu, marido e filho de seis anos), jantávamos num dos restaurantes da parte
histórica da cidade quando, ao olhar para um aparelho de TV, vejo uma imagem de
enormes novelos vermelhos de chamas a sair de edifícios, enchendo o ecrã da
RTP.
Uma imagem aterradora. De quase fazer parar a respiração...
Era “o coração de
Lisboa que estava a arder”, comentava Mário Crespo, desde a madrugada daquele
dia 25 de Agosto.
O
incêndio destruiu os armazéns do Grandella e toda a zona envolvente,
traduzindo-se na maior catástrofe da cidade após o terramoto de 1755.
Levou quase tudo -
a Casa Batalha, a Pastelaria Ferrarri, obras de Fernando Pessoa, a partitura original
do Hino Nacional, o espólio da discoteca Valentim de Carvalho e a Perfumaria da
Moda. A Versace fechou e a Pompadour também. A Única, a Sopal e muitas outras desistiram.
Os clientes divorciaram-se de um Chiado submerso em ruínas.
Além de lojas e
escritórios foram destruídos muitos edifícios do séc. XVIII e os piores
estragos foram na Rua do Carmo, vedada ao acesso das viaturas de socorro.
O fogo causou dois
mortos - um bombeiro e um residente - fez dezenas de feridos, destruiu 18 edifícios,
desalojou cinco famílias num total de 21 pessoas e deixou duas mil
desempregadas.
Depois foi
preciso reedificar de novo, de acordo com o projecto de reconstrução do arquitecto Siza Vieira - recuperar
o que se podia recuperar (muitas fachadas originais) e construir de raiz sobre
o que já não tinha remédio.
“Demasiado
tempo", recorda Vítor Silva, dirigente da Associação de Valorização do
Chiado (AVC), entidade criada logo após o incêndio para representar os
comerciantes que também queriam participar na reabilitação da zona. “Boa parte
dos que escaparam ao fogo não sobreviveu a tantas escavações, abrir e fechar de
ruas e calçadas, poeira a infiltrar-se nas fendas das portas e das janelas, barulho
das retroescavadeiras e martelos pneumáticos: O Chiado quase que se desarticulou
da área envolvente”.
A
zona mais nobre de Lisboa reabriu aos poucos - chegaram novos habitantes, cafés design e marcas de luxo.
Voltou a ser um
importante centro de comércio de Lisboa e uma das zonas mais cosmopolitas
e movimentadas, palco de eventos emblemáticos como o Vogue Fashion's Night Out.
O vereador da Reabilitação
Urbana da Câmara de Lisboa, Manuel Salgado diz que, “se não houver imprevistos
no decorrer dos trabalhos, a última fase deste plano, a ligação pedonal do
chamado «Pátio B» às ruínas da Igreja do Carmo, ao largo do Carmo e ao elevador
de Santa Justa, pode ficar concluída em 2014”.
Vai pôr-se aquele espaço a descoberto, a estrutura da cabeceira da igreja à
vista e far-se-á «um terraço com uma vista espectacular sobre a colina do
Castelo e o Rossio».
A isto junta-se «um elevador que sai da rua do Carmo, do espaço de uma loja
municipal para permitir que as pessoas com dificuldades de locomoção possam
subir directamente para essa plataforma, e daí, no futuro, ter acesso ao museu
de arqueologia».
Vamos então esperar que "não haja imprevistos" para que não se transforme noutra Igreja de
Santa Engrácia (actual Panteão Nacional) que levou cerca de 350 anos a construir
porque, fundada em 1568, ruiu em 1681, começou a ser reedificada em 1682 e
só foi completada em 1966.
Será mais um "elefante branco"?
Outra imagem do novo Chiado
E porque
ardeu o Chiado de forma tão galopante?
As causas nunca
foram esclarecidas.
Passados 25 anos ninguém sabe como tudo começou…
Certo, é que as chamas só pararam no edifício
do Montepio, que tinha estrutura corta-fogo.
Fazendo referência ao que consta sobre o assunto, encontrei alguns excertos:
- Recordando o que
foi dito em 1988 há uma revelação curiosa na primeira pessoa feita por “uma
antiga funcionária dos Armazéns Grandella - descobriu que alguém tinha serrado
uma torneira de segurança”
-O Diário de Lisboa
do dia 25 de Agosto de 1988 escreve que o guarda do elevador de Santa Justa
afirma que foi só às 3,00 horas que os bombeiros foram avisados do início do
incêndio e que «o fogo começou no rés-do-chão, propagando-se muito
rapidamente».
- O jornal O
Independente escreve na edição de dia 26 de Agosto de 1988, que uma testemunha
ocular, Fernando Corte Real, afirma ter visto, na rua do Crucifixo, uma
carrinha a sair dos Armazéns Grandella.
A PSP, citada pelo mesmo jornal diz que
essas declarações «não têm qualquer fundamento».
-Também as fontes
sobre a hora a que o incêndio deflagrou nos Armazéns Grandella são diversas e
contraditórias. A verdade mais ajustada será a de que terá acontecido entre as 01:00 e as 04:00.
- O Diário de
Notícias de 26 de Agosto de 1988 escreve que «eram cerca de cinco horas quando
uma pequena coluna de fumo começa a esgueirar-se pela fenda do vidro de uma das
montras do Grandella».
João Marques e Joaquim Sintrão, dos
bombeiros da Pontinha, aquando do simulacro que assinalou os 25 anos na zona
atingida pelas chamas, recordaram algumas coisas insólitas como:
- “Um tanque que descarregou 18 mil litros
de água em 17 minutos e que, com a força, levou o fogo de um prédio para o
outro, tendo que reagir depressa para tirar quatro homens de um prédio que
viria a desabar”
- "O Presidente da República [Mário
Soares] ao ter vindo sobrevoar a zona de helicóptero, alimentou o fogo com o
vento das hélices."
- Para Veiga, "O que falhou foi não terem
chamado os bombeiros mais cedo. O fogo começou de madrugada mas ninguém chamou
os sapadores. O porquê fica por investigar, mas há os registos que o
provam", garante.
- "Há o ANTES e o DEPOIS do Chiado e o
responsável por essa revolução nos socorros em Lisboa é o coronel Veiga",
diz ao lado o comandante Fernando Curto, que não deixa a presença do mentor
passar em vão. "Nunca é só uma pessoa", segreda Veiga, como se
fechasse um capítulo da história.
Chiado à noite
IMAGENS GOOGLE