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sábado, 2 de maio de 2020

CONJUNTURA


Sentado no sofá, imóvel, cabeça recostada e olhos fechados, parece “treinar” a fluência da incapacidade cognitiva.

- Não vai ficar aí o dia todo! Veste um casaco e faz três caminhadas à volta do quarteirão. 
- Não, não vou (mas, com algum retardo psicomotor, inexpressivamente, levantou-se). Qual casaco?
- É melhor levar o telemóvel...
- Não, não sei usá-lo. Não vejo.(negativismo, sempre)

Aquele sentimento exagerado de ansiedade sem razão fundamentada, fobia, domina todo o modo de proceder desde sair à rua, encontrar pessoas, desorientar-se no tempo e no espaço. A perda da memória de procedimento torna difícil a execução de rotinas automáticas como vestir, lavar, abrir uma torneira, ligar a TV, o telemóvel ou o PC. Esquece as actividades da vida diária, uma conversa recente, o local onde ficaram a chaves, o pequeno almoço.
Ler e escrever não fazem parte da comunicação e a capacidade para compreender a linguagem falada ou encontrar as palavras adequadas, é lenta. Utiliza frases curtas de palavras quase imperceptíveis e de baixa tonalidade. 


- Encontrou alguém conhecido?
- Eu? Não, não encontrei. Choveu. Onde ponho o guarda-chuva?

A deambulação, em sintonia com a ansiedade, é cansativa, extenuante. 
Perante a percepção das dificuldades que tendem a agravar-se sem esperança de melhoras, o estado de ânimo exacerbou-se. E os já existentes sintomas depressivos de apatia, passividade e desinteresse, acentuaram-se. Ao contrário, a anterior hipocondria, com ou sem razão genuína, que valorizava  em excesso a preocupação com o seu próprio estado de saúde, passou a ter, aparentemente, menos relevância. Em poucos dias, uma maior lentidão global dos movimentos dificulta a marcha, os movimentos dos membros superiores, a estabilidade postural

- O que prefere como sobremesa: banana, kiwi ou maçã?
- Hum... (enigmático)
Para disfarçar a dificuldade em decidir, prefere ignorar e continuar com o comportamento anterior. Acontece sempre nas perguntas com opção de resposta

Também a memória remota, tão presente e  prejudicial nos estados precedentes começa a esfumar-se. O termo "culpado" ficou para trás...

- Os relógios não estão sincronizados. Uns precisam de acertar os pêndulos, outros de corda, outros de pilhas... Pode tratar disso?
- Não sei das chaves. Não sou capaz (e, stressado pelo facto, reage com tremor das mãos)


 A formação de placas no cérebro, (proteína beta-amilóide) continua a ser uma patologia misteriosa.

O mal de Alzheimer mata as células do cérebro (Neurónios), tornando- o mais pequeno, quer pela contínua diminuição/necrose de células, quer por menos conexões entre os neurónios sobreviventes.

Ao microscópio, o tecido cerebral apresenta dois tipos principais de anomalias:

Placas - constituídas por uma pequena proteína, a beta-amilóide (principal suspeita), que podem danificar e destruir as células do cérebro, incluindo a interferência com a comunicação entre elas.
Emaranhados de neurofibrilas - As células cerebrais dependem de um apoio interno e externo para transporte de nutrientes e outros materiais essenciais.
Este sistema é formado por microtúbulos que formam um canal e proteínas TAU ligadas com eles.
A formação de emaranhados neurofibrilares de Tau no interior das células cerebrais leva ao colapso do sistema de transporte e não permite expulsar  os resíduos (a beta-amilóide neste caso).

É muito difícil conviver com estas perturbações se não se aprender a saber lidar com elas , a preservar-se, a aceitar sem revolta ou desespero a transformação que nos pode desestruturar e afundar

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2 comentários:

  1. Situação deveras triste e preocupante.
    Sabemos que qualquer um de nós, pode vir a desenvolver a doença!
    Durante a minha vida profissional segui de perto alguns casos, com idades bem abaixo dos 65 anos !
    Sempre difíceis e de desfecho doloroso.  
    Muita capacidade de resiliência vai ser necessária!
    Hoje existe a linha de apoio na Demência da Alzheimer. Talvez não deva ser descurada.
    Um forte abraço.

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    1. Sim, é! Quando falamos destas situações soa-nos a distância. Pensamos sempre que isso não tem nada ver connosco...E então, aí está ela!
      Já começa a faltar “espaço” para tantos mimos destes.
      Pra já, recuso-me a pensar na última etapa, a da total dependência, em que o que existe, mais não é do que uma entidade que lhe toma o lugar
      Obrigada.
      Beijinho

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