Deve ser muito pouco comum ficar a olhar como que
pasmada, durante umas fracções de segundo, quando se vai entrar num carro.
Aconteceu isso comigo, no início da década de 60.
E agora, ao contrário daquela diminuta interrupção de
atitude, reduzida à exclamação muda de um “oh! Que espanto!”, ocorreu-me,
também num ápice, o remoto momento do cenário.
Tinha chegado a Lisboa, vinda da minha Beira Alta, apenas
há alguns meses. Era Verão e começava a fazer novas amizades.
- Queres ir á praia? Pergunta-me uma companheira de
estudo. Conheço A que traz um amigo; podemos ir os quatro pró Tamariz.
- Vamos, então.
Feitas as apresentações, dirigimo-nos para o nosso meio
de transporte – o automóvel
E o condutor abre a(s) porta(s) de uma forma nada
convencional… para cima.
Devo ter ficado alí, “ausente”, a olhar para aquele belíssimo
pássaro prateado até ouvir - “entre, T.”
Gostaria de descrever o modelo mas não sei. Pela imagem de longo prazo retida, acho que devia ser um Mercedes-Benz SL, modelo “asa de
gaivota”, concebido nos anos 50, muito semelhante ao Mercedes-Benz 300SL
Gullwing Coupe, o protagonista de “E o Vento Levou”, comprado pelo próprio
actor Clark Gable … ou um Mercedes-Benz SLR McLaren.
O modelo é também conhecido por nele terem andado as
atrizes Marilyn Monroe e Ava Gardner.
Hoje parece ser ainda um dos mais pretendidos pelos
apaixonados de carros desportivos e, quando negociado em leilões atinge, normalmente,
valores muito altos.
A praia do Estoril/piscina do Tamariz era, na altura, frequentada
pela fina-flor da sociedade nacional e estrangeira devido aos muitos refugiados
ricos zarpados da guerra e das
perseguições racistas e políticas do nacional-socialismo alemão e de outras
ditaduras europeias anti-semitas, ex-chefes de governo, ex-monarcas de
países ocupados pelas tropas alemãs, agentes secretos, aristocratas, escritores e actores que por lá tinham passado,
a caminho de exílios de luxo.
Piscina do Tamariz - década de 60
Os panos dos toldos, barracas e cadeirinhas eram
recolhidos e guardados ao fim do dia e montados novamente pela manhã, transportados
ao ombro, pelo pessoal efectivo da Estoril-Sol.
Os balneários já tinham duche de água fria e havia também
cabines privadas com duche quente.
Praia do Tamariz/Estoril
Lembro-me de uma «Praia-Piscina-Flutuante»
erguida sempre no Verão, ao largo do Tamariz, com capacidade para cerca de cem pessoas
que pagavam o transporte e usufruto do espaço balnear. Do equipamento faziam
parte guarda-sóis, colchões, snack-bar e instalações sanitárias.
Piscina flutuante
E como as Docas ainda não existiam, era no Casino e em bares/discotecas
que as noites se animavam.
Casino do Estroril anos 60
Ainda hoje me recordo nitidamente do quanto maravilhada
me senti naquele dia tão pouco vulgar para uma provinciana como eu.
Jardins do Casino e Praia do Tamariz, agora
Porem, nas décadas seguintes, o crescimento industrial da
"cintura" lisboeta e a poluição acabaram por degradar aceleradamente
toda essa distinção da «Riviera Portuguesa», até à bem visível decadência actual (embora se notem algumas tentativas de recuperação).
A relva insípida dos jardins do Casino ajusta-se a nouveaux-riches. E o que
se ganhou em infra-estrutura do footing perdeu-se em glamour!
Imagens Google