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domingo, 23 de junho de 2024

A CADEIRA


Às vezes o mundo parece um lugar injusto e sem sentido, desagradável, cheio de obstáculos, decepções, problemas, estagnado, triste, imprevisível.
E indiferente.

“... Não sentem: por isso são deputados e financeiros,
Dançam e são empregados no comércio,
Vão a todos os teatros e conhecem gente…
Não sentem: para que haveriam de sentir?

…”

Álvaro de Campos, in "Poemas"

Outras vezes é o imprevisível que nos surpreende com bons momentos.

- Olha, tens um aviso na caixa do correio para levantares uma carta registada nos CTT. Eu levo-te lá porque só pode ser feito pelo próprio.
- Agradeço, sim.
- Agora, enquanto fazes isso, vou arranjar um lugar para deixar o carro. Talvez não demore.

Entretanto, já com a carta registada na mão, fui andando até à saída do edifício e depois, junto à parede, fui encostar-me ao primeiro veículo que encontrei, num lugar bem visível.

- Eu vou buscar uma cadeira prá senhora; só um momentinho (ouvi dizer, em sotaque brasileiro).
- Muito obrigada, não é preciso porque estou à espera da boleia do meu filho que não deve demorar (respondi eu, sem saber ainda quem estava a ser tão gentil)

E, sem mais, em menos de um minuto, vejo um rapaz transportando uma cadeira de polipropileno preto com braços, saindo da garagem de uma bomba de gasolina. Colocou-a ao meu lado e disse:
- Vai fazer o favor de se sentar. Assim espera melhor.


De seguida retirou-se para ficar em pé, atrás das portas envidraçadas do local de onde tinha saído, com um certo ar de “vigilante”

Quando viu que a minha “boleia” estava a aproximar-se, veio, então, buscar a cadeira.

Apesar de ter estado ali por pouco tempo, chegou para sentir a diferença entre o conforto e o desconforto.

- Que bem que se estava aqui. Com este belíssimo sol, quase me senti numa esplanada de praia! Obrigada (agradeci com um sorriso).

E não é que de súbito, apesar de estar ainda com a cadeira na mão, me pareceu ter à minha frente uma pessoa completamente distinta?
A expressão entediante moldada pelos diferentes músculos faciais transformou-se, como que por magia, numa expressão de sorriso aberto, de orelha a orelha, e um olhar reluzente de satisfação.



Na vida, umas vezes há tristeza outras vezes há beleza. Nunca se sabe o que se vai encontrar ao virar da curva.


segunda-feira, 10 de junho de 2024

"ENEIDA LUSITANA"


Hoje é o dia de Portugal erguer mais alto a sua bandeira, símbolo da sua soberania, independência, unidade, integridade, historia, valores, sentimentos, lutas, patriotismo.

“Há muita semiótica escondida no uso das bandeiras que age sobre o inconsciente. Triunfam porque provocam grandes emoções. Quando a identidade está em perigo, a pessoa apoia-se  na bandeira” José Enrique Ruiz-Domènec, professor de história na Universidade Autónoma de Barcelona.
“Quando a bandeira passa a identificar uma coletividade ela começa a ter uma carga simbólica mais forte e mais emocional. As pessoas precisam de se identificar com um grupo, e a bandeira é uma forma simples de expressar uma ideia muito complexa.” José Manuel Erbez, bibliotecário da Universidade de La Laguna e secretário da Sociedade Espanhola de Vexilologia (a ciência que estuda as bandeiras).




Inspirado num passado glorioso, Camões busca a identidade de um povo em "Os Lusíadas" - Quem somos, o que nos define, que missão temos na História.
"A verdade que eu conto, nua e crua, vence toda a grandíloqua escritura!" Os Lusíadas, Canto V, 89.

A sua vida, em muitos aspectos, continua a ser um mistério porem, a sua poesia, de uma grande beleza literária, faz de Os Lusíadas uma obra universal, com traduções em várias línguas como espanhol, russo, francês, alemão, italiano, húngaro, holandês, japonês, dinamarquês, sueco e esperanto.
Com Luís Vaz de Camões, Portugal  relembra os feitos passados do povo lusitano e os milhares de portugueses que vivem fora do país.


Jorge Luís Borges
(Buenos Aires, Argentina, 1899 – Genebra, Suíça, 1986)

A Luís de Camões

Sem lástima e sem ira o tempo arromba
As heroicas espadas. Pobre e triste
À tua pátria nostálgica voltaste,
Ó capitão, para nela morrer
E com ela. No mágico deserto
Tinha-se a flor de Portugal perdido
E o áspero espanhol, antes vencido,

Ameaçava o seu costado aberto.
Quero saber se aquém da ribeira
Última compreendeste humildemente
Que tudo o perdido, o Ocidente
E o Oriente, o aço e a bandeira,
Perduraria (alheio a toda a humana
Mutação) na tua Eneida lusitana.

Jorge Luís Borges
In: O fazedor. Lisboa: Difel, 1985.




Pinterest

E Amália Rodrigues canta Camões


1965
Amália editou um disco de 45 rotações - Amália Canta Camões - com gravações de "Erros Meus", "Lianor", "Dura Memória". 
Na mesma altura, diversas personalidades do meio literário e artístico, como Hernani Cidade, David Mourão Ferreira, Alain Oulman, Alexandre O´Neill, José Gomes Ferreira, Urbano Rodrigues, Maria Teresa de Noronha e Júlio de Sousa, davam o seu parecer sobre esta inovação, "atípica no Fado". Uns eram a favor mas outros, totalmente contra.
Camões, o príncipe dos poetas, não deveria ser cantado no Fado…
Amália e os Poetas - Fundação Amália Rodrigues



In Google

sábado, 8 de junho de 2024

MEIAS PESSOAS



Era dia de tratamento muscular e tinha acabado de chegar ao fim da primeira rua do percurso servindo-me de um muro de arrimo, como encosto. 
Sentada no parapeito da janela de uma montra de pinturas, aguardava, como habitualmente, a  sempre boa vontade de L para continuar a curta caminhada, agora um pouco mais íngreme.
O desiquilíbrio é grande e a respiração, devido á pressão que a coluna exerce nas vias aéreas, fica difícil. 
A diferença de altura entre os dois ombros curvados pela cifose disfuncional originada por instrumentação imprópria e a consequente inclinação da cabeça para a frente, não só limitam o espaço do horizonte, como o transformam numa paisagem de Betão,  carros,  plantas, meias pessoas e pequenos animais, ou seja, no chão.

Já preparada para me prender na confortável "ortótese" vejo, do outro lado da rua, umas pernas correndo, quase tropeçando no vestido, a entrar num carro que se esfumava, num ápice, como se as rodas fossem asas…


- Que estranho, aquilo ali. Parecia que tinha assaltado um Banco. Viste?
- Vi. Não sabes quem era?
- Não, só vi umas pernas meio ensarilhadas, muito apressadas, a entrar num carro que se pôs em marcha velozmente.
- Era a C.
- Sim?
- Sim.

"Digeri" a cena durante alguns momentos e, mesmo sem a ter compreendido, tirei as minhas conclusões.

"As coisas que se vão ensinam o
valor das que permanecem…
Os que morrem, o valor da vida.
Os arrependimentos, o tempo perdido.
A dor, o tamanho da nossa fragilidade."
Silmara Nogueira


quinta-feira, 6 de junho de 2024

KNOCK, KNOCK




Talvez The Oldest Song in the World nada tenha a ver com o conteúdo do tema. Mas é, pelo menos, um repousante antidoto.

https://youtu.be/Brvy4BbK2ZQ

Batem à porta truz, truz.
- Quem é?
- Sou … Não venho por bem. Sou aquela que aparece quando o pâncreas não produz a insulina, a hormona necessária para transportar a glicose do sangue para as células do corpo, afim de ser utilizada para produzir energia.
Sou a Diabetes.
- Mas … instala-se assim, sem mais?
- Sem mais? E que mais é preciso? Os níveis de glicemia em jejum, são muito superiores a 100mg/dL, decorrente da incapacidade de a insulina exercer adequadamente os seus efeitos (hiperglicemia de forma permanente); a tensão arterial é bem alta (hipertensão) assim como o colesterol; o sobrepeso é considerável e as alterações nos lípidos também; depois há o uso de medicamentos da classe dos glicocorticoides… As condições são excelentes!
Realmente, já não era novidade uma sensação de boca seca, alguma transpiração, infeções frequentes da pele por distúrbios no sistema imunológico , sonolência e cansaço.

- Só faltava mesmo mais este Knock, knock …!
Quando se bate à porta, quem está do lado de lá, pode fazer uma de duas coisas: ignorar ou ver quem bate e, talvez abra a porta.
Mas não é que a porta se abriu sem talvez?


Alimentos para diabéticos





My Cuf

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