O Natal tem raízes pagãs.
O teólogo Orígenes, no ano 245 d.C., não aceitava a ideia
de se festejar o nascimento de Cristo “como se fosse um Faraó” e os primeiros
cristãos desconheciam a data porque não a comemoravam.
A celebração oficial foi instituída pelo Papa Libério, no
ano 354 d. C. embora na parte Oriental do Império Romano já se festejasse a 7
de Janeiro, no ano 336 d. C.
No século IV as igrejas ocidentais passaram a adoptar o
dia 25 de Dezembro para o Natal e o dia 6 de Janeiro para a Epifania. Assim, em
vez de proibirem as festividades pagãs, atribuíram-lhes os símbolos e a
linguagem cristãos - “ sol da justiça” / “luz do mundo” para o nascimento do
deus “Sol Invencível” dos romanos (Saturno) e do deus persa “Sol da Virtude”
(Mitra).
Actualmente, devido à globalização, o Natal português tem
sido influenciado por outras culturas, ficando também associado ao Pai Natal e
à árvore de Natal.
Porém, as tradições natalícias não desapareceram - “ceia
de Natal”, “Missa do Galo”, presentes e almoço melhorado no dia 25.
A “Missa do Galo”, por falta de párocos em muitas
freguesias, decaiu; só se celebra a missa do meio-dia/manhã.
Os hábitos gastronómicos variam de norte a sul do país.
Reviver o Natal na Beira Alta
No dia 24 a lareira parecia maior. Queimava lenha de
carvalho para se manter acesa até à meia-noite e fazer esquecer o frio provocado
por grandes quedas de neve ou geadas. De vez em quando acrescentavam-se umas giestas
negrais para a avivar que estalavam como faíscas e iluminavam a cozinha toda,
fazendo esquecer a pequena luz da ainda candeia de azeite ou do candeeiro de
petróleo.
Era preciso aquecer a casa para a consoada, a nossa e a do
vizinho António que vivia só e tinha lugar cativo no canto junto da chaminé.
A Igreja incentivava os católicos a não comer “carnes
vermelhas” e “ quentes” e a seguir, pelo contrário, uma dieta de "comidas frias" como o peixe.
Com o tempo, o jejum foi sendo abolido e acabou
substituído pela refeição ”Consoada” na véspera do Dia de Natal.
- Curiosamente foi no tempo das expedições marítimas,
século XV e XVI que o Vaticano decretou que jejuar devia ser uma prática dos católicos como
reconhecimento ao sofrimento de Cristo. Ele, Vaticano, era proprietário da maior frota
bacalhoeira, os armazéns abarrotavam e o peixe salgado também se estragava…
Os comerciantes, ao optarem pela venda, facilitaram a aquisição.
Barato e nutritivo, o bacalhau passou a ser o peixe
escolhido pela maioria dos portugueses para substituir os alimentos proibidos . Daí o ditado: “Para quem é, bacalhau
basta”!
E bacalhau não é um peixe. É um método de conservação do
peixe no sal (tratamento pelo sal e secagem) -
Portanto, a nossa consoada era bacalhau cozido com
batatas, couve portuguesa e ovos, tudo bem regado com azeite espanhol. Os
homens bebiam vinho tinto feito no lagar da casa. Como sobremesa, havia aletria
ou arroz-doce.
A seguir deixava-se o borralho para ir à “Missa do Galo”.
Mas antes, cada um de nós colocava em cima do fogão de
lenha, que ficava ao lado da chaminé, os maiores sapatos que tinha porque,
durante a noite viria o Menino Jesus colocar neles as prendas - figos secos,
muitos rebuçados, nozes e castanhas piladas. Outros presentes adicionais variavam
de ano para ano como tecido para vestidos ou qualquer outro no género.
Só podiam ser vistas na manhã do dia 25 e então, como a
ansiedade era enorme, quase não dormíamos para, bem cedo, irmos ver os sapatos.
È que acreditávamos mesmo!
Mas a curiosidade, um dia, levou-me a espreitar a “descida”
e, hélas!- era a Mãe que estava a distribuir os mimos…
Lembro-me de ter sentido alguma desilusão e,
simultaneamente, também aquele prazer da descoberta de um segredo.
A partir daí as prendas nunca mais precisaram do sapatão
porque, como seria óbvio, transmiti logo aos irmãos mais novos.
FOGUEIRA -JUNTO AO ADRO DA IGREJA
Ao sair da missa da meia-noite aquecíamo-nos todos numa grande
fogueira feita no largo junto ao adro da Igreja que ficava a arder durante toda
a noite até os troncos se converterem em cinzas quentes, já perto da manhã.
No dia 25 era a Missa de Natal.
Os paroquianos rejubilavam de alegria, cantando ao ritmo
das teclas do órgão da Igreja, tocado pelas mãos “mágicas” da “Menina
Alicinha”.
E o Menino era dado a beijar aos fiéis, pelo Pároco que o
ia limpando após cada ósculo, com um pequeno pano branco de linho e rendas.
PRESÉPIOS DE MUSGO
Na Igreja havia um enorme Presépio, no espaço do coro à
esquerda, logo atrás da divisória/cancela.
Era feito de musgo, planta rasteira com muitos rizoides, apanhado
pelas crianças em pedras sombrias e cascas de árvores. Nele se construía, com a
colaboração de várias pessoas mais ligadas às atividades do culto, uma enorme
Aldeia à volta dum estábulo onde se encontrava o Menino Jesus, Nossa Senhora,
S. José, a vaca, o burro, pastores e ovelhas. Tinha riozinhos, pequenas
cascatas, caminhos, montes, casinhas e muitas mais ovelhas e pastores. Todas as
figuras eram de barro e coloridas.
No dia seis de Janeiro, que era dia “Santo de Guarda”,
acrescentavam-se os Reis Magos com os presentes.
Grandes e pequenos passavam horas ali a olhar para a
“maravilhosa obra” que com tanto enlevo tinham ajudado a construir.