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segunda-feira, 10 de maio de 2021

JUNTARAM-SE OS DOIS NA ESQUINA


- O C do grupo do almoço de cozido telefonou a dizer que já tinha saudades desses encontros…

- O ? Qual C? Não, não vou.

- E o F,  lembra-se dele? Era dos que nunca faltavam. Agora, que é Avô, foi para perto da filha, em Oeiras

- Mas ele tem filhos? (sempre soubera que tinha… ). Estou a lembrar-me é do V. Quantos filhos tem?

- Qual V?

- O da T, da Curia

- Então não se lembra da J e do M?

- Sim… sim

- E o R, o que faz? Ele que idade tem?  

- Quer ver umas fotos? 

- São tantos! Vejo muito mal.  Pois, pois , dizia à medida que ia olhando para as imagens com alguma superficialidade.  

- Como já lhe disse, ando aqui a fazer o meu calendário. Hoje é que é 2ª feira, não é?

- É 5ª feira, dia 29.

- É Domingo? (depois de perguntar várias vezes, escreve o dia da semana e do mês, numa pequena agenda que mantém escondida numa gaveta)

Amanhã precisamos de ir à Cerdeira

- Ainda bem, gosto de lá ir ver a M. (noutros tempos, dizia que preferia ficar…)

Costuma levantar-se cedo e tomar banho com água quase fria (não espera que aqueça). O P.A. e a terapêutica, obrigatoriamente preparados no dia anterior, fazem parte da sequência.  (Antes de se deitar, rectifica a quantidade de comprimidos uma boa  dezena de vezes). 

Haja frio ou não, dá, também, o habitual passeio de 15 minutos pelo Bairro, alheio aos vizinhos ou às pessoas “conhecidas” com que se cruza. Anda sempre em frente, devagar, de braços caídos e olhos no chão, até uma determinada meta, onde faz “inversão de marcha” para voltar a casa.

- O que é o meu almoço? Agora vou ali sentar-me no meu cantinho ver as noticias (é difícil saber se as vê porque ou não as transmite ou as modifica). 

- Está um lindo dia, diz sempre, quando o silêncio se prolonga.

E assim, entre o permanecer ali sentado e o ficar em pé com as mãos atrás das costas, junto à cozinha, vai esperando pelo almoço…

Geralmente não fala durante toda a refeição. (Quando estou a comer, não posso falar, diz, se interrogado). Aliás, com o aumento progressivo da surdez e da dificuldade no desenvolvimento de sucessões de ideias, o diálogo é muito difícil. E o convívio, sem troca de ideias, difícil se torna também.  

- Não percebo /não percebi, é a resposta a qualquer tentativa de comunicação. No entanto, apercebendo-se dessa dificuldade, desenvolve estratégias para a ocultar como: não faz mal, não tem importância, etc.

Representação de neurónios: A. de indivíduo saudável B. de paciente com Alzheimer. 
Fonte: Extraída de de Falco et al., 2016

Não é uma palavra muito comum nem tampouco o deveria ser na cirurgia que, mesmo sendo feita correctamente, com as placas e parafusos bem posicionados,  pode  dar origem a uma sobrecarga mecânica nos implantes com aparecimento de cifose e desequilíbrio juncional devido ao aumento de pressão ou trauma nas vértebras vizinhas causados pela fixação do segmento. E a situação de risco aumenta em casos de infecção no local da cirurgia.

Refiro-me à artrodese, um  procedimento cirúrgico realizado com a intenção de estabilizar o movimento entre duas ou mais vértebras através da formação de pontes ósseas que as unem, impedindo a movimentação e formando um bloco  ósseo no segmento operado. Porem, ao gerar-se a doença do nível adjacente, acima e abaixo dos segmentos fundidos, desenvolve dor crónica com resposta difícil ao tratamento. Scoliosis Research Society


E assim é:
Lá em cima está o tiro-liro-liro
Cá em baixo tá o tiro-liro-ló

Juntaram-se os dois na esquina
Tocar a concertina, dançar o solidó

«O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até ao ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, preservá-lo e abrir espaço» Ítalo Calvino


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