Quando eu deixar de ser
O sol continuará a aquecer
O alvor do dia a aparecer
As lareiras a acender
As marés a subir/ descer
Os campos a florescer
Os pacientes a sofrer
O triunfador a vencer
Quando eu já não existir
Não há tristeza a carpir
Palavras pra exprimir
Afectos a sobressair
Saudades pra sentir
Objectivos a aplaudir
Decepções a repartir
Ou corações a demolir
Eu dei o melhor de mim
Mas ninguém viu assim.
Sobre o exalar a alecrim
Passou o sabão ”clarim”
As flores do “meu jardim”
Secaram como o capim
E o meu vestido em cetim
Se sumiu no mundo, enfim
Após a sentença fatal
Não haverá qualquer ritual
Nem velório, nem funeral
Só a incineração banal
E uma viagem fluvial
Feita de saudade especial
Do meu querido filho, tão leal
Companhia única, afinal.
Isto é o que
quero para mim quando, como todas as pessoas, tiver que ser.
Sempre pensei
assim – sem velório nem funeral.
Não me é nada
fácil olhar para familiares ou outras pessoas conhecidas, deitadas, sem vida ,
dentro de um caixão. Nem ver cair as primeiras pás de terra na sepultura…