Apetece-me, contudo, recordar o tempo em que a esperava com entusiasmo, até por volta dos meus 10 anos.
E a minha Avó Emília, os meus tios Zefinha e Joaquim, os meus primos Luís, Margarida, Imelda, Toninho e Zezinho que, connosco, grande família também, viviam todos os momentos casuais, oportunos ou festivos numa perfeita simbiose. Juntos, enchíamos a nossa casa mas na deles, porque era enorme, cabia sempre mais o Bispo ou qualquer outra ilustre personalidade.
Na 5ª e 6ª feira santas a aldeia quase ficava paralisada por respeito à crucificação de Cristo, mas o sábado era já um dia de muita azáfama a fazer ”à vez”, bolos e biscoitos no forno público, a preparar o cabrito para o almoço de domingo e a limpar ruas e casas para que o Compasso fosse recebido com o cheiro fresco do ar campestre.
No Domingo de Páscoa ia-se à missa com a roupa nova; depois almoçávamos numa mesa com toalha branca onde havia arroz doce, aletria e outras iguarias
Logo depois preparava-se a mesa para receber o Compasso pela tarde, ou seja, o Pároco de sobrepeliz e estola brancas precedido pelos membros da paróquia, de opa, levando o crucifixo, a campainha e a caldeirinha com água benta.
Para comunicar o início, as crianças tocavam o sino da Igreja e as famílias, amigos e vizinhos esperavam, reunidos na sala, que o padre chegasse e lhes desse a cruz a beijar.
Todos os paroquianos gostavam de receber a “Boa Nova” e a “ Bênção Pascal “ excepto 2 ou 3 que não abriam a porta.
- Vai um copinho, Sr. Padre?
- Mas só um copinho, porque hoje comecei cedo!
- E uma fatia de bolo ou qualquer outro doce?
Em todas as casas havia que provar qualquer coisa, desde o vinho fino ao bolo, um petisco ou simplesmente uma amêndoa.
Ao finalizar o acto, era servido um licor e biscoitos aos portadores da cruz.
E assim percorriam, a compasso, as casas dos paroquianos.
A última era sempre a da minha tia Zefinha que apresentava uma mesa cheia de iguarias mais para jantar - chouriço, presunto, vários queijos, além de toda a doçaria e bebidas (razão porque o Pároco comia e bebia menos nas casas anteriores). Depois ficava por lá o resto da tarde. E nós também.
Alias, do que mais gostávamos, era andar atras do compasso desde a primeira casa. Mal se ouvia dizer “o compasso já anda na rua”, era um autêntico frenesim correndo de casa em casa
"A melhor parte da nossa memória está fora de nós"- Marcel Proust
O folar é o bolo da Páscoa em Portugal.
Segundo Maria de Lurdes Modesto e Afonso Praça, “O folar seria uma espécie de contraponto do pão ázimo que tem o peso teologal do sacrifício e da penitência”.
Para outros, o folar era o presente que os padrinhos e madrinhas davam aos afilhados na Páscoa, para quebrar o período de grande jejum e que só deixavam de dar quando eles atingiam a maioridade ou casavam.
Eu fiquei sem madrinha ainda bebé. Logo, sem procedência para receber o meu presente.
Por isso dedico este pedacinho do rabisco à minha saudosa avó Emília que sempre teve a arte de nos encantar com um enorme folar no Domingo de Páscoa. Um folar de azeite, muito doce e de fatias tão amarelas como a gema dos ovos!
Algumas generalidades:
Da Páscoa cristã, ficaram tradições e símbolos:
- A Cruz da Ressurreição
- O cordeiro
- Pão e Vinho
- O Cirio
- Ovos de Páscoa
- Coelhinhos de Páscoa
2- Há diferentes espécies de folares em Portugal,
consoante a região - doces e salgados; redondos, de forma ovalada, em forma de
coração e também de animais.
Alguns “Apanhados”:
De cima para baixo e da esquera para a direita:
1- De qualquer região
2- Folar dos Açores
3- Várias zonas, sbretudo do Douro para baixo
4- Folar de Tras-os-Montes e forno
5- Folar de Coimbra
6- Folar do Algarve
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