O Dia Internacional da Felicidade foi assinalado este ano pela primeira vez e 20 de Março será a data de mais um dia mundial - o da Felicidade.
A resolução foi aprovada no ano passado, por consenso, pelo plenário das Nações Unidas para celebrar “a felicidade e o bem-estar, objetivos e aspirações de todo o mundo”, reconhecendo a relevância da felicidade e do bem-estar como objetivos universais na condução das políticas que os países desenvolvem.
Declara também “a necessidade de se dar uma atenção mais equitativa e equilibrada ao crescimento económico de modo a promover o desenvolvimento sustentável, a erradicação da pobreza, a felicidade e o bem-estar de todos os povos” e “convida os Estados membros (193), as organizações da ONU e as demais organizações internacionais e regionais, assim como a sociedade civil, a celebrar de maneira apropriada o Dia Internacional da Felicidade com atividades pedagógicas e de consciencialização".
A ideia para a criação deste dia foi lançada pelo Butão, um pequeno reino budista localizado nos Himalaias, que adopta como estatística oficial a “Felicidade Nacional Bruta”(FNB) em vez do Produto Interno Bruto (PIB).
O termo foi criado pelo rei do Butão, Jigme Wangchuck em 1972 como resposta às críticas feitas ao fraco crescimento da economia no seu país, comprometendo-se a desenvolvê-la baseada nos valores espirituais budistas.
Segundo a “Businesses”, a proclamação do novo Dia Internacional da Felicidade foi muito comemorada pelos representantes do Butão, país mais feliz da Ásia e oitavo do mundo, sobretudo porque a ideia, além de ter sido sugerida por eles, também teve a aprovação unânime na ONU.
À pergunta da Rádio ONU no Facebook “O que te faz feliz”, os ideais de felicidade mais citados foram a família, a saúde, bons amigos, esperança e a própria vida.
Até agora, o calendário da ONU integra 120 dias mundiais e internacionais dedicados a temas tão diversos como às mulheres rurais (15 de Outubro), ao jazz (30 de Abril) ou às aves migratórias (14/15 de Maio).
Muitos governos dizem que elementos como a felicidade deviam ser incorporados na forma de medir a prosperidade, dominada apenas por indicadores económicos.
Mas, afinal, o que é a felicidade?
A ONU define-a "como um dos objetivos fundamentais do ser humano".
No Relatório pedido à Universidade da Columbia conclui-se que, na generalidade, a riqueza faz as pessoas mais felizes mas que outros fatores como a liberdade política, fortes ligações sociais e a ausência de corrupção são, no seu conjunto, mais importantes que o salário, o que explica algumas diferenças de bem-estar entre os países que se encontram no topo e no fundo da lista.
Ao nível individual, ter boa saúde mental e física, ter alguém em quem confiar e ter um emprego e família estáveis, são fatores fundamentais para a felicidade.
Os cientistas dizem tratar-se de uma vasta área de investigação, estudada por economistas, políticos, sociólogos e psicólogos.
A presidente da Associação Portuguesa de Estudos em Psicologia Positiva, Helena Marujo, em entrevista à Renascença, considera que “é difícil ser feliz ao lado de pessoas que não o são, o que é cada vez mais frequente. Quanto maior for a injustiça social e a diferença entre ricos e pobres, menor será a felicidade”.
“A felicidade é um estado durável de plenitude, satisfação e equilíbrio físico e psíquico, em que o sofrimento e a inquietude são transformados em emoções ou sentimentos que vai desde o contentamento até a alegria intensa ou júbilo. A felicidade tem, ainda, o significado de bem-estar espiritual ou paz interior.” Wikipédia
Desde a Antiguidade que muitos filósofos consideraram a felicidade como o fim último da vida humana e muitos foram os tratados sobre os caminhos para encontrá-la.
Epicuro, na Carta sobre a Felicidade, afirma que "o prazer é o início e o fim de uma vida feliz".
Aristóteles inicia o Livro 1, Ética Nicomaqueia, discorrendo sobre a finalidade das ações que praticamos: "Se há, então, para as ações que praticamos, alguma finalidade que desejamos por si mesma, sendo tudo mais desejado por causa dela, e se não escolhemos tudo por causa de algo mais, evidentemente tal finalidade deve ser o bem e o melhor dos bens. Não terá então uma grande influência sobre a vida o conhecimento deste bem?"
Portanto, para Aristóteles, um homem feliz é um homem virtuoso, a felicidade é algo final e autossuficiente, o fim a que visam as ações.
A Minha Felicidade
“Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente
Navego com todos os ventos.”
Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"
A felicidade é um tema central do budismo, doutrina religiosa criada na Índia por volta do século VI a.C.
Um dos grandes mestres contemporâneos do budismo, o Dalai Lama diz que “a felicidade é uma questão primordialmente mental, no sentido de ser necessário, primeiramente, identificar os fatores que causam a nossa infelicidade e os fatores que causam a nossa felicidade. Uma vez identificados esses fatores, bastaria extinguir os primeiros e estimular os segundos, para se atingir a felicidade.”
Sobre o Butão
Fundado por monges tibetanos há 4 séculos, o Butão é o país mais isolado do mundo. A escravidão sobreviveu oficialmente até meados do século 20.
Estevão Cacella, missionário jesuíta português, foi o primeiro europeu a entrar no Butão. Viajou através dos Himalaias em 1626 e no fim de uma estadia de quase oito meses escreveu uma longa carta no Mosteiro Chagri a relatar as suas viagens. É o único relato que resta.
De 1720 a 1970 esteve sob domínio da China ou da índia. Em 1971 tornou-se membro das Nações Unidas.
Em 1972, um jovem rei de 17 anos acabado de ser coroado decretou que o “ Produto Interno Bruto" não era mais importante do que a ‘felicidade interna bruta’.
A população é gente simples que trabalha a terra.
O pequeno reino de 38,4 mil quilómetros quadrados tem 72,5% da sua área coberta por florestas e lugares exóticos, 34 rios e uma riquíssima biodiversidade. Abriga cerca de 2000 templos e mosteiros budistas.
Até 1999 não havia internet, TV e telemóvel porque o rei achava que isso poderia prejudicar o interesse do povo pelas tradições, harmonia familiar, excesso de consumo, falta de cuidado com a natureza e religião budista.
Thimphu é a capital e sede administrativa e Paro, a única cidade do país que tem aeroporto.O FIB é uma medida que avalia a felicidade dos habitantes de dois em dois anos e que pode ser conferido pela internet em site oficial.
Enquanto os modelos tradicionais de desenvolvimento têm como objetivo primordial o crescimento económico, o conceito de FIB baseia-se no princípio de que o verdadeiro desenvolvimento de uma sociedade humana surge quando o desenvolvimento espiritual e o desenvolvimento material são simultâneos, complementando-se e reforçando-se mutuamente.
Os pilares da FIB são:
Promoção de um desenvolvimento socioeconómico sustentável e igualitário
Preservação e promoção dos valores culturais
Conservação do meio ambiente natural
Estabelecimento de uma boa governança
Wikipédia
Segundo o economista Hirata, é “um exagero dizer que em breve o mundo vai deixar de perseguir a meta do crescimento económico” mas já começa a refletir, também no âmbito da ONU que, além da economia, haverá a considerar o social, o ecológico e o bem-estar nas políticas dos países e das reuniões internacionais.
A Felicidade Interna Bruta não é uma lei escrita, mas um ideal que vem norteando as decisões do governo nos últimos 30 anos
O ambiente faz do Butão um dos países mais bonitos do mundo pelo que poderia ser um dos maiores locais turísticos. Mas não é porque o turismo tem limites para não prejudicar a cultura e o meio ambiente.
A venda de tabaco é considerada crime a fim de “proteger as gerações presentes e futuras do seu efeito devastador”. Mas existe mercado negro sem que ninguém se preocupe com isso porque para a FIB, o “bem-estar vem antes do dinheiro" e quem fuma não é punido.
Como há pouca industrialização no país, não há “necessidade” de uniões de trabalhadores.
Para seguir a diretriz da “preservação da cultura”, a população é obrigada a usar as roupas tradicionais da maioria budista.
E ai de quem queira praticar outra religião.
Qualquer argumento serve para tirar cidadanias - 90% dos emigrantes vive, no Nepal, em campos de refugiados da ONU.
A ONU, o Banco Mundial, o Banco de Desenvolvimento Asiático e, principalmente, a Índia financiaram mais de 90% dos projetos de desenvolvimento do país.
Diz no Bhutan Times: “O rei notou que houve mudanças no pensamento levando a práticas de corrupção tanto no governo como no setor privado”. “Corrupção não é mais uma palavra nova. Temos de aceitar essa dolorosa realidade”.
Por ironia da história, esta nação aparece no 141º lugar (de 187) do Índice de Desenvolvimento Humano 2011 da ONU, em 142º lugar (em 183 países) na lista do Doing Business de 2012 e em 111º lugar (de 179 países) na lista do Índice de Liberdade Económica 2012 da Heritage Foundation.
(Bruno Garschagen, mestre em ciência política e
relações internacionais pela Universidade Católica de Portugal, especialista do
Instituto Millennium).“Há uma enorme invasão da liberdade. E felicidade é algo individual. Um governo interferir na busca por ela, é acreditar que o cidadão não tem capacidade de tomar decisões para o seu próprio bem”.
(Patrícia Carlos de Andrade, economista e diretora do Instituto Millennium, centro de pesquisa de economia liberal em São Paulo).
Agora cabe ao futuro dizer se a política da Felicidade Interna Bruta, com tantas contradições, está a ajudar o país a crescer ou se está a torná-lo mais isolado dentro do silêncio do Himalaia.
Imagens Google
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