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quinta-feira, 24 de outubro de 2013

NOTA ESCRITA - TESTEMUNHO


Van Gogh, Noite Estrelada


A 14 de Outubro passado, o “sistema irreversível de cessação das actividades biológicas necessárias à caracterização e manutenção da vida não deixou que M.J.M.P. completasse 90 anos dentro de muito poucos dias.

Filha de Pai militar e de Mãe de nacionalidade francesa tinha uma personalidade marcante e aspecto altivo. Era determinada, optimista, exigente, carismática, elegante, senhora.
Nos que lhe eram menos próximos, suscitava simultaneamente sentimentos de alguma intimidação e respeito.
Lembro-me de ter sido o que senti quando ingressei na Escola onde me formei e da qual era Directora. Demorei mesmo a dissociá-la, enquanto aluna, dessa imagem - ideia que penso ter sido partilhada por outros.

Pouco tempo depois, talvez num "processo de selecção por competências", fui convidada para colaborar na equipa do corpo docente.
A proximidade e o contacto passaram a ser diferentes. Todavia, de início, apesar da particularidade que caracterizava a nova situação, o “mito” continuou a persistir até ter assimilado a minha nova categoria e a diferença de idades.

Mas com o decorrer do tempo, fui descobrindo nobreza de alma, amizade, companheirismo, sinceridade, confiança.



Como líder, visava dirigir as pessoas dando-lhes responsabilidade e liberdade no trabalho, delegava, reunia regularmente para ouvir opiniões e aplaudia iniciativas.
O trabalho progredia com respeito, confiança, envolvimento pessoal e entusiasmo de maneira suave e espontânea, mesmo quando estava ausente.




Fomos duas boas companheiras em Inglaterra numa visita de fim de curso de um grupo de alunas, percorremos alguns outros lugares pelo País num agradável convívio entre colegas e fez várias vezes de anfitriã na casa de praia de familiares seus.
Apesar de parca nos elogios sentia-se que, além de apreciar o nosso trabalho, também se interessava pelas pessoas noutros pormenores dizendo por ex., com uma certa ternura: “ A F.T. podia procurar tirar um enorme partido da expressividade dos olhos…”

E assim corriam os dias, enquanto o grupo de docentes era restrito.

Porém, à medida que a Escola ia crescendo, tornava-se necessário recrutar novos colaboradores, baseando a escolha na clareza sobre o que seria  fundamental procurar-se no candidato para preencher uma determinada posição na equipe, sem que “o barulho da opinião dos outros” abafasse o objectivo.
 “Um verdadeiro chefe não necessita de testes psicológicos nem de informações para escolher os seus colaboradores. Todos os grandes homens são dotados de intuição.” Alexis Carrel

Pelo que atrás descrevi, M.J.M.P. era “uma verdadeira chefe”.


Mas passou a haver um tempo em que me pareceu ter perdido feeling, sabedoria e colaboração para escolher pessoas.
E a necessária mútua confiança inicial para que todas os pareceres se pudessem manifestar nessas deliberações, deu lugar a uma falta de abertura quando o grupo se reunia.
Foram entrando candidatos sem as evidentes competências, previamente definidas e consideradas fundamentais para o desempenho no cargo em questão.

Como pessoa de bem, apenas confiava...



... Jamais imaginando que, na “revolução dos cravos”, seriam exactamente esses a quem deu crédito, os "não mentalmente aceites" por alguns dos primeiros colaboradores, que a viriam a trair, humilhar, desalojar e demitir, transformando a Escola num local desagradável, sem dignidade e de muita espécie de abusos (apelidados de “liberdade”).









Porque não me foi possível dizer-lhe um último adeus, expresso aqui, desta forma, o meu testemunho de estima e respeito.




Imagens Google

2 comentários:

  1. Pessoa marcante,sem dúvida!
    Faz parte da minha trajetória!
    A sua altivez era sinónimo de afastamento.Nas suas aulas ,havia um silencio sepulcral!Todas a receávamos.
    Não me lembro de lhe ver um sorriso,mesmo no privilegio de convidada-irmã de Monitora a entrar na sala do café dos professores.
    Apesar da proximidade,durante os três anos do curso ,não surgiu uma ocasião favorável para mudar de opinião.Pena minha!
    Fiquei com a ideia de que deveria ser muito boa gestora,pois parecia-me que tudo corria com a maior ordem!
    Bjinhos

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    Respostas
    1. ÓI
      Aqui fica a tua (sua, como diria o Mário Crespo) opinião!
      Era realmente muito "contida", fruto da educação e das regras da Escola onde se formou, penso.
      Abraço grande

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