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quinta-feira, 14 de agosto de 2014

QUASE ETÉREO


A casa onde nasci, mandada construir pelos meus avós maternos há mais de cem anos, tecto dos meus pais durante sete décadas e palco dos respectivos e numerosos descendentes, é hoje uma mansarda onde o burburinho deu lugar a ausências e silêncios.

Ontem, às 2 horas da noite, semideitada sobre a cama do que foi meu quarto durante alguns anos, começei a escrever estas linhas. Sentia-me como se estivesse num espaço suspenso no vácuo, sem ruas nem vozes em redor, ideal para quem sofra de misofonia.

Lá fora via-se uma luz ténue, vigilante, a iluminar as janelas da varanda e os contornos - desenhados no céu estrelado - do telhado duma antiga e buliçosa oficina de ferreiros e da copa da frondosa nogueira cuja sombra refrescava o burro que, de olhos vendados, fazia gemer os alcatruzes de uma nora.
Cá dentro, uma pequena melga, motivada pela curiosidade, insistia, atrevida, em me fazer companhia.

Ah! Estava a esquecer-me dos condutores noctívagos que passam ali na estrada ao lado de vez em quando; e dos aviões marcando a passagem na abóboda acima das nossas cabeças a 9/11 mil metros de altitude, a qualquer hora...


Porem, durante o dia, apesar de os compartimentos terem ficado desabitados, a casa não denuncia o vazio. 

Há cortinas renovadas, camas sempre feitas, móveis limpos e objectos “no lugar”, plantas e flores frescas dentro e no pátio, e retratos, muitos retratos de todas as gerações, nas paredes e nas mesas.
Porque a minha irmã M. faz questão de a “viver” com frequência como se o tempo e os acontecimentos em nada a tivessem alterado. 
Até a existência de gatos contribui para manter aquela particularidade do ambiente “acolhedor" criado pelos meus Pais.

Afinal"ainda estamos todos cá”…




Passar uns dias na Casa da Minha Aldeia proporciona sempre uma sensação de bem-estar e de tranquilidade revigorantes. 
Tudo o que a rodeia faz evocar o silêncio como palavra de ordem - na sabedoria ancestral da escultura da natureza em pedras de arte não aprimorada ou na sonoridade musical dos montes que a resguardam.




Amanhã, dia 15 (e nalguns mais), a aldeia retoma a voz da alegria e do regozijo, do desassossego das festas. Os sinos repicarão sons mais agudos e metálicos, haverá procissões, fogo-de-artifício (ou já não), bailaricos, bandas filarmónicas, muitos emigrantes, automóveis, romaria à Senhora do Monte - a mais importante festa da Freguesia



Em rodapé, sou tentada a partilhar um pouco mais da bela, única e admirável paisagem da minha Beira Alta



2 comentários:

  1. Gostei de ler.
    E gosto,sempre, quando escreves sobre vivencias mais ou menos comuns.
    Continua assim.
    Bjinhos

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  2. É. Às vezes basta um desenho, uma palavra, uma foto, ou qualquer outro pequeno detalhe para se retratar um processo vivencial...
    Jinho

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